domingo, 10 de janeiro de 2010

Privação do uso - Jurisprudência do STJ

- A mera privação do uso de um veículo, independentemente da demonstração de factos reveladores de um dano específico emergente ou de um lucro cessante, não é susceptível de fundar a obrigação de indemnização, no quadro da responsabilidade civil.

- Não basta a simples alegação e prova de que a não restituição do andar aos proprietários está a causar-lhe prejuízos, para que daí resulte, sem mais, designadamente sem a alegação e prova dos factos relativos aos restantes pressupostos da responsabilidade (ilicitude, culpa e nexo de causalidade entre a conduta ilícita e os danos sofridos) e, além do mais, sem a concretização dos prejuízos sofridos.
- Não tendo sido provada (nem alegada) a natureza e a espécie dos prejuízos sofridos, não dispõe o Tribunal dos elementos necessários para a condenação na sua reparação, pois só pode condenar em caso de existência de danos reparáveis que carecem de ser demonstrados, o que, desde logo, pressupõe a identificação dos mesmos, mediante a sua alegação.
- Carece o Tribunal de conhecer se se trata de danos patrimoniais ou não patrimoniais, se de danos emergentes ou de lucros cessantes e, enfim, saber em que é que consistiram os prejuízos para aquilatar do valor dos mesmos, pois a indemnização civil tem como escopo precípuo a reconstituição da situação que existiria se não tivesse ocorrido o evento causador do prejuízo ou, pelo menos, a compensação do lesado, em termos equitativos, pelos danos sofridos.
- Por isso, cabe aos interessados a quem a lei reconheça o direito à indemnização pelos prejuízos sofridos, a alegação e a prova de tais prejuízos, enquanto factos concretos constitutivos do alegado direito, não sendo suficiente a vaga e genérica alegação de que determinada conduta está a causar-lhes prejuízos, o que se traduz em puro e simples juízo conclusivo.

- Desde que a violação do direito de propriedade e a decorrente privação do uso derivem da prática de acto ilícito, a par do pedido de reivindicação, nos termos do art. 1311.º do CC, pode ser formulado o pedido de indemnização, como forma de repor a situação anterior e de reparar os prejuízos decorrentes da privação, como ocorre quando esta atinge bens imóveis.
- Se se provar que a indisponibilidade foi causa directa de prejuízos resultantes da redução ou perda de receitas, da perda de oportunidades de negócio ou da desvalorização do bem, não se questiona o direito de indemnização atinente aos lucros cessantes.
- Mas mesmo que nada se prove a respeito da utilização ou do destino que seria dado ao bem, o lesado deve ser compensado monetariamente pelo período correspondente ao impedimento dos poderes de fruição ou de disposição. A simples falta de prova (ou de alegação) desses danos concretos não conduz necessariamente à denegação da pretensão indemnizatória.
- Sem embargo da prova que possa ser feita da total ausência de danos, não deve descartar-se o recurso à equidade para encontrar, no balanceamento dos factos e das regras de experiência, um valor razoável e justo. Não é imprescindível que o lesado invariavelmente alegue e prove a existência de danos efectivos.

- É susceptível de ressarcimento o dano decorrente da imobilização prolongada da viatura sinistrada, pertencente a empresa transportadora e utilizada habitualmente nessa actividade empresarial, devendo proferir-se condenação genérica, a concretizar no âmbito de procedimento de liquidação, dentro dos limites do pedido originariamente concretizado pelo lesado, quando na acção se prove a existência de tal dano, sem todavia se apurar o seu quantitativo.

- A privação do gozo de uma coisa pelo titular do respectivo direito constitui um ilícito que o sistema jurídico prevê como fonte da obrigação de indemnizar, pois que impede o respectivo proprietário de dela dispor e fruir as utilidades próprias da sua natureza.
- A questão da ressarcibilidade da “privação do uso” não pode ser apreciada e resolvida em abstracto, aferida pela mera impossibilidade objectiva de utilização da coisa.
- Uma coisa é a privação do uso e outra, que conceptualmente não coincide necessariamente, será a privação da possibilidade de uso: - Uma pessoa só se encontra realmente privada do uso de alguma coisa, sofrendo com isso prejuízo, se realmente a pretender usar e a utilizasse caso não fosse a impossibilidade de dela dispor; não pretendendo fazê-lo, apesar de também o não poder, está-se perante a mera privação da possibilidade de uso, sem repercussão económica, que, só por si, não revela qualquer dano patrimonial indemnizável.
- Bastará que a realidade processual mostre que o lesado usaria normalmente a coisa, vendo frustrado esse propósito, para que o dano exista e a indemnização seja devida.

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