- O direito à indemnização derivado da supressão do direito à vida, deve ser entendido como um direito próprio do familiar do falecido e não como um direito da vítima que, por via sucessória, se comunica aos familiares (art. 496º nº 2 do C.Civil).
- Isto não invalida que, como danos próprios, as pessoas indicadas no art. 496º nº 2, possam reivindicar para si uma indemnização pelos danos morais derivados pela perda da vítima.
- A jurisprudência mais recente deste STJ tem vindo a ressarcir o dano morte (supressão da vida) entre 50.000 e 60.000 €, havendo escassas decisões em que foram fixadas indemnizações superiores ou inferiores a estes montantes.
- Maioritariamente tem-se vindo a fixar esse dano na importância de 50.000 €.
- Na atribuição de um valor maior ou menor por esse dano, deve-se atender às circunstâncias concretas de cada caso.
- Tratando-se, no caso, da morte de uma pessoa de 41 anos de idade e portanto, com uma esperança de vida ainda longa à sua frente, sendo pessoa considerada e estimada por todos quantos com ela privavam ou conheciam, sendo, igualmente, querida e amada pelos seus pais e irmã e sendo pessoa que se encontrava bem inserida meio físico e social que a rodeava, o prejuízo sofrido foi relevante, pelo que se revela adequado ressarcir o respectivo prejuízo com uma indemnização de 50.000 €.
- São indemnizáveis os danos não patrimoniais no âmbito da responsabilidade contratual, devendo a indemnização ser fixada segundo critérios de equidade.
- Não é de autonomizar a indemnização por dano resultante da violação do direito à sexualidade e à procriação, que radica no direito à integridade física, integrando uma das componentes de danos não patrimoniais.
- Danos não patrimoniais são os que afectam bens não patrimoniais (bens da personalidade), insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, de que resultam o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, de modo a atenuar os padecimentos derivados das lesões e a neutralizar a dor física e psíquica sofrida, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.
- O dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo o chamado quantum (pretium) doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e incapacidade temporária, com tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamentos, a analisar através da extensão e gravidade das lesões e da complexidade do seu tratamento clínico; o “dano estético” (pretium pulchritudinis), que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima; o “prejuízo de distracção ou passatempo”, caracterizado pela privação das satisfações e prazeres da vida, vg., com a renúncia a actividades extra-profissionais, desportivas ou artísticas; o“prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica), integrando este prejuízo a quebra na “alegria de viver”; o “prejuízo da saúde geral e da longevidade”, em que avultam o dano da dor e o défice de bem estar, e que valoriza as lesões muito graves, com funestas incidências na duração normal da vida; os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida; o prejuízo juvenil “pretium juventutis”, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida, privando a criança das alegrias próprias da sua idade; o “prejuízo sexual”, consistente nas mutilações, impotência, resultantes de traumatismo nos órgãos sexuais; o “prejuízo da auto-suficiência”, caracterizado pela necessidade de assistência de uma terceira pessoa para os actos correntes da vida diária, decorrente da impossibilidade de caminhar, de se vestir, de se alimentar.
- No domínio da quantificação do dano não patrimonial, em que não entram considerações do “ter” ou “possuir”, “perder” ou “ganhar”, mas do “ser”, “sentir”, ou “sonhar”, não rege a teoria da diferença, nem faz sentido o apelo ao conceito de dano de cálculo, pois que a indemnização/compensação do dano não patrimonial não se propõe remover o dano real, nem dá lugar a reposição por equivalente.
- A valoração dos danos não patrimoniais depende de uma apreciação sobre matéria de direito – o que ocorre sempre que se faça uso da equidade –susceptível, portanto, de apreciação no STJ.
- Só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que afectem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral, medindo-se a gravidade do dano por um padrão objectivo, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, mas afastando-se os factores subjectivos, susceptíveis de sensibilidade exacerbada, particularmente embotada ou especialmente fria, aguçada, requintada, e apreciando-se a gravidade em função da tutela do direito.
- O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no art. 494.º, como decorre do n.º 3 do art. 496.º do CC, sendo de atender ao grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
- Com a cláusula de equidade, prevista em geral no art. 4.º e permitida, no que ora interessa, nos arts. 496.º e 566.º, n.º 3, do CC, o tribunal resolverá o litígio ex aequo et bono e não ex jure stricto. Em causa está conceito relacionado com justiça natural, igualdade, imparcialidade, justiça.
- No que se refere à fixação do montante correspondente a compensação por danos não patrimoniais, é possível distinguir quatro soluções jurisprudenciais, a ter presentes: afastamento/desconsideração do critério de compensação do dano morte como padrão para compensação dos danos não patrimoniais de sobreviventes grandes traumatizados, argumentando-se que, sendo a vida o bem supremo, a valoração da sua perda não pode ser excedida pela resultante das dores e sofrimentos; estabelecimento do justo grau de compensação, havendo que ter em conta, como é entendimento praticamente unânime, que a indemnização por danos não patrimoniais tem de assumir um papel significativo, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação”, não se compadecendo com a atribuição de valores meramente simbólicos, nem com miserabilismos indemnizatórios; da intervenção correctiva limitada por parte do Tribunal Superior, posto que alguma jurisprudência defende uma intervenção do tribunal de recurso limitada e restrita na fixação deste tipo de danos, não se justificando essa intervenção caso se entenda que a indemnização foi adequadamente fixada, sendo reveladora de bom senso; soluções de fixação de montantes relativamente ao dano em causa em situações paralelas, nas quais se tem em consideração o sentido das decisões sobre a matéria, os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, fazendo-se a comparação do caso concreto com situações análogas equacionadas noutras situações judiciais, não se perdendo de vista a sua evolução e adaptação às especificidades do caso sujeito – os padrões de indemnização que vêm sendo adoptados pela jurisprudência, nomeadamente os mais recentes, constituem também circunstância a ter em conta no quadro das decisões que façam apelo à equidade.
- Revertendo ao caso concreto, e considerando que: o menor ficou paraplégico, sem sensibilidade abaixo da linha intermamilar, fazendo infecções urinárias, respiratórias e dermatológicas e úlcera na região occipital, sendo ventilado durante 15 dias; em consequência do acidente ficou internado mais de 8 meses; foi submetido a várias intervenções cirúrgicas, com anestesias gerais e sequente sujeição a programas de reabilitação física; a incapacidade temporária geral total foi de 765 dias, o que significa que durante os anos completos de 2004 e 2005, esteve impedido de realizar com razoável autonomia as actividades da vida diária, familiar e social, sendo do mesmo período a incapacidade temporária para a actividade ocupacional habitual de estudante; efectuou 197 deslocações ao Centro de Medicina de Reabilitação entre a data da alta deste e a data da propositura da acção cível enxertada, tendo efectuado outras 82 deslocações ao Hospital no mesmo período; foi submetido a tratamentos de acupunctura; padece de quantum doloris de grau 6, numa escala de 7, de dano estético de 5, numa escala de 7 graus; padece de ausência de controle de esfíncteres, obrigando a uso de fraldas e de bebegel, tendo a necessidade de fazer algaliação de 3 em 3 h, constituindo uma situação irreversível; tem necessidade de ter vigilância do foro urológico, tomando diariamente dois comprimidos para o funcionamento da bexiga; ficou na dependência de ajudas técnicas (cadeira de rodas, ortóteses e botas ortopédicas), médicas fisiátricas e medicamentosas, bem como do apoio de terceira pessoa; tem a perspectiva de viver numa cadeira de rodas até ao fim dos seus dias; necessita de fisioterapia e hidroterapia para não agravar o seu estado; acresce a perda do avô, com quem seguia no veículo embatido, estando encarcerado cerca de 40 m. ao lado do mesmo, já morto, só dele conseguindo falar e chorar a sua morte mais de dois meses transcorridos sobre o acidente, afigura-se adequado fixar a indemnização por danos não patrimoniais em € 250 000.
- Nem todos os danos não patrimoniais são ressarcíveis: só o são aqueles que sejam suficientemente graves para justificar a tutela do direito (art. 496.º, n.º 1, do CC).
- São dignos de ressarcimento, a esse título, porque suficientemente graves, os danos sofridos pela vítima do acidente de viação, traduzidos em acentuadas dores (fractura da tíbia e do perónio), subsequentes tratamentos (designadamente, o necessário tratamento cirúrgico), incómodo relativo causado pelo esforço físico, sofrimento, angústia e apreensão.
- Não há indemnização sem dano.
- O facto de a autora “se sentir enganada” pela ré, de “imputar a esta uma depressão nervosa pela frustração do negócio”, que nem se conhece se viria a realizar-se com êxito, de “se sentir desorientada e frustrada”, de “sentir angústia e preocupação”, sem mais qualificativos, não é indemnizável, por não ser, só por si, merecedor da tutela do direito.
- O dano biológico traduz-se na diminuição somático-psiquica do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem o sofre.
- O dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial tal como compensado a título de dano moral. A situação terá de ser apreciada casuisticamente, verificando se a lesão originou, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, numa afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade.
- E não parece oferecer grandes dúvidas que a mera necessidade de um maior dispêndio de esforço e de energia, mais traduz um sofrimento psico-somático do que, propriamente, um dano patrimonial sendo certo que o exercício de qualquer actividade profissional se vai tornando mais penoso com o desgaste natural da vitalidade (paciência, atenção, perspectivas de carreira, desencantos…) e da saúde, tudo implicando um crescente dispêndio de esforço e energia.
- E esses condicionalismos naturais podem é ser agravados, ou potenciados, por uma maior fragilidade adquirida a nível somático ou em sede psíquica.
- Ora, tal agravamento, desde que não se repercuta directa – ou indirectamente – no estatuto remuneratório profissional ou na carreira em si mesma e não se traduza necessariamente numa perda patrimonial futura ou na frustração de um lucro, traduzir-se-á num dano moral.
- Estas indemnizações tendem a proporcionar um certo grau de satisfação de vida em ordem a, tanto quanto possível, atenuar os sofrimentos de ordem moral e física sofridos em resultado do acidente e que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito – artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil – sendo de fixação equitativa – n.º 3 do mesmo artigo 496.º. Subjazem-lhes sempre, contudo, um juízo de censura ético-juridica, com certa componente sancionatória.
- A fixação dos montantes indemnizatórios por danos não patrimoniais deverá nortear-se por critérios de equidade, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 494.º do Código Civil.
- Entre estas é, porém, de afastar, por violação do princípio constitucional da igualdade, a relativa à situação económica do lesado.
- Na fixação do “quantum” indemnizatório releva ainda, por força do artigo 8.º, n.º3 do mesmo código, o que vem sendo decidido pelos tribunais em casos semelhantes, em especial por este Supremo Tribunal.
- Os danos morais ou prejuízos de ordem não patrimonial são prejuízos insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património, não devendo confundir-se com os danos patrimoniais indirectos, isto é, aqueles danos morais que se repercutem no património do lesado, como o desgosto que se reflecte na capacidade de ganho diminuindo-a, pois esta constitui um bem redutível a uma soma pecuniária.
- Porque estes danos não atingem o património do lesado, a obrigação de os ressarcir tem mais uma natureza compensatória do que indemnizatória, sem esquecer, contudo, que não pode deixar de estar presente a vertente sancionatória, sendo apenas de ressarcir aqueles danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (artigo 496°, nº 1, do Código Civil), gravidade que deve ser apreciada objectivamente.
- É admissível a indemnização por danos não patrimoniais no âmbito da responsabilidade contratual.
- Em matéria de responsabilidade extracontratual, em princípio, apenas são indemnizáveis os danos sofridos pelo lesado, ou seja, o titular do direito violado ou do interesse protegido pela disposição legal violada.
- Apenas nos casos excepcionais previstos nos arts. 495º e 496º, nº 2 do Cód. Civil, a lei admite o ressarcimento dos danos indirectos provocados a terceiros.
- Não são, assim, indemnizáveis os danos vulgarmente chamados “reflexos” ou indirectos que, fora dos casos previstos nos referidos arts. 495º e 496º, sejam indirectamente causados a terceiros.
- São indemnizáveis os danos morais directos ou reflexos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, tenha o facto lesivo causado ou não a morte da vítima (art. 496.º do CC).
- São concretamente ressarcíveis os danos morais sofridos pelo autor em consequência do acidente de viação que vitimou a autora, sua mulher, e do qual resultaram para esta lesões e sequelas várias que comprometeram gravemente os direitos de coabitação (no qual se inclui o débito conjugal), cooperação e assistência de que o autor é titular enquanto membro da sociedade conjugal formada com a autora.
- Nesta perspectiva, tais danos são directos, e não reflexos ou causados a terceiros, na medida em que atingem concomitantemente ambos os autores, enquanto pessoas casadas entre si.
- Não se deve interpretar restritivamente o n.º 1 do art. 496.º do CC, por via do seu n.º 2.
- Por isso, e considerando que a qualidade de vida da Autora, mulher do lesado, ficou profundamente afectada, os seus direitos conjugais amputados numa parte importante para uma mulher jovem e o seu projecto de ter mais filhos irremediavelmente comprometido, assiste-lhe o direito a indemnização, a título de danos não patrimoniais, que deve ser equitativamente fixada no montante de 50.000€.